terça-feira, 13 de outubro de 2015

Sobre Cristianos,

Araujo ou Ronaldo. Porque o nome é o que menos importa.

Escrevi este texto alguns dias após o fatídico acidente que tirou a vida do cantor.

Hoje faz 11 dias que faleceu o cantor Cristiano Araújo, e venho depois disso tentar compreender o que vem acontecendo com a mídia, as redes sociais e nosso dia a dia.
A mídia (Empresas Globo) ainda estão fazendo programas, matérias, dando destaque não só ao fato do acidente fatal mas também à carreira deste cantor que teve o termino da vida tão precoce. Quando coloco as Empresas Globo como centro disso tudo é pelo simples motivo de seu braço musical, a Som Livre, possuir grande parte da distribuição e divulgação dos artistas ligados ao ramo musical conhecido como Sertanejo Universitário.
Houveram diversas discordâncias com relação ao tema, uma parte da sociedade afirmando que desconhecia o trabalho do cantor e outra parte deixando claro que conhecia seu trabalho. O momento belicoso e polarizado do país se mostrou mais uma vez, pessoas achando que desconhecer o trabalho do cantor era uma falta de respeito, pessoas que faltaram com o respeito com a pessoa do cantor por não gostar de sua obra, matérias de revistas sensacionalistas fazendo uma leitura sócio-econômica-cultural do país a partir do fato do conhecimento ou não do trabalho do cantor, mostrando um despreparo sobre vários temas.
Cristiano Araújo tinha (pelo menos em minha pesquisa, perdoe-me se estiver errado) 6 CDs lançados e alguns sucessos, sendo o mais famoso o “Bara Bara”.
A morte do cantor, a exploração midiática e a situação belicosa com que foi encarado mostram algumas coisas, mostra que as redes sociais realmente deram voz às pessoas, todas as pessoas, de todas as “tribos”, línguas e filosofias, pessoas pró e contra a exploração midiática do fato apareceram, defenderam seus pontos de vista, alguns famosos e anônimos foram julgados por não conhecer ou não achar a obra do cantor algo de relevante valor cultural para o país, outros mostrando que gostavam e cantavam e quando podiam iam ao show.
No fundo o que percebo é que pouco disso tem a ver realmente com a morte e a dor dos próximos ao cantor, tem a ver com a qualidade da obra por ele cantada e/ou composta. Tudo isso tem a ver como a mídia mostrou e explorou o caso.
Pelo cantor possuir um contrato com a Som Livre faz todo sentido as Empresas Globo fazer mídia da situação, isso valoriza o cantor, valorizando seus trabalhos (CDs e DVDs) que são vendidos pela empresa, trazendo o lucro esperado, pois o único motivo que tanto o cantor quanto a empresa produziu o material é para obter  lucro, como todos nós trabalhamos em nossos empregos seja ele qual for.
A minha opinião sobre o caso é que entendo a situação da empresa, se concordo ou não é outro fato, eu entendo. Ela existe como empresa para obter seu lucro, como todas empresas existem e como todos trabalhamos para isso. A Rede Globo valoriza o artista que esta em contato com ela por que isso significa a própria valorização e ela sabe que este mercado musical do sertanejo universitária é muito dinâmico e rápido, logo outros cantores ou duplas surgirão e Cristiano cairá no esquecimento, ou alguém aqui lembra qual foi o “Bara Bara” de 2011? Não, quase ninguém lembra, mostrando como este sucesso evapora, não falo aqui se a obra é boa ou ruim, apenas constato que o mercado necessita sempre de novidades para vender.
Aos críticos deste movimento, digo que precisam apoiar e incentivar os artistas musicais de seu agrado neste caso, para fortalecer um mercado e que desta maneira consigam lucro neste mercado para atingir mercados maiores, sei do discurso purista do: “isso é bom e deveria estar na mídia”, nem sempre é assim e não falo na arte apenas, em se tratando de mercado a situação é sempre complexa, tem de existir a tensão oferta/demanda, todos procuram situações melhores para si e as empresas não agiriam de maneiras diferentes. Eu sei que os meios de comunicação possuem uma liberação estatal para funcionarem e que por isso deveriam fazer contrapartidas culturais e artísticas, mas isso também é assunto para um outro papo, hoje me retenho a situação como ela realmente é.
A morte deste jovem cantor só foi importante para a mídia por que a mídia lucrou, tanto com a vida e também com a morte do cantor.
Seu primeiro nome era Cristiano, o segundo foi Araújo ou Ronaldo, por que o nome é o que menos importa se gerar lucro.
Meus sentimentos sinceros aos amigos, parentes e fãs do cantor.

Sim, ja ia me esquecendo, os sucessos sertanejos de 2011 foram, Fugidinha (Michel Teló) e Adrenalina (Luan Santana), confesso não ter sido fácil encontrar a lista das mais tocadas em 2011.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

A COPA DO MUNDO E A (des)VALORIZAÇÃO DA CULTURA BRASILEIRA


   

     Com toda certeza, o evento mais esperado do ano é a Copa do Mundo de futebol organizado pela FIFA (Federação Internacional de Futebol). 

     A Copa do Mundo desde junho/julho de 2013 tem sido alvo de grandes críticas, não pela Copa em si, todos sabem que o brasileiro gosta muito de futebol, e sim pelo grande investimento na Copa. No entanto, não se vê o mesmo empenho em outras áreas do serviço público e isto é um direito. 

     E o viés cultural disso tudo? E o artista brasileiro no meio disso tudo? E a cultura brasileira? Estas perguntas não foram respondidas e passam desapercebidas pela maioria das pessoas. Então,  proponho que caminhemos por dentro delas, revelemos algumas coisas veladas por muitas dificuldades e façamos críticas a este grande evento mundial. Vamos colocar mais lenha na fogueira.

     A defesa e manutenção da cultura está assegurada na Constituição Federal (Cap.III Seção II, Art. 215 e 216), portanto é obrigação sua manutenção e desenvolvimento pelo Estado. Quanto a isso não há dificuldades e interpretações diferentes. 

     E a realidade como funciona? Vamos exemplificar esta questão tão profunda usando a Copa do Mundo como um funil onde as diversas questões são aglomeradas na prática diária. 

     Dificilmente você vê no dia a dia manifestações artístico-culturais brasileiras nos meios de comunicação e de apresentações (tv, eventos, festivais, etc.), manifestações como o frevo, o forró, o choro, o côco, o maracatu, carimbó, xote, chamarrita, dentre muitas outras.

     Os governos em sua maioria investem muito mais em trabalhos eruditos, como grupos de ballet, orquestras, do que em grupos folclóricos, e aqui não imputo valor ao trabalho, se é bom ou ruim.  Mas levanto uma questão, porque na Copa do Mundo estas manifestações que recebem mais apoio e incentivo não representarão o Brasil na grande festa de abertura e encerramento? Qual o motivo?
     Uma matéria da Folha de São Paulo mostra que a abertura do grande evento acontecerá com manifestações populares (danças e músicas) do Brasil. Então, o que menos aparece e recebe apoio é o que vai nos representar? Isso parece estranho, não?

     A Copa do Mundo é no Brasil, portanto a abertura e encerramento têm que mostrar o que o Brasil tem e é, assim concluímos que a cultura popular é o que realmente representa um País, por isso da importância de sua manutenção e defesa como esta na Constituição. Se o que nos representa como povo e país é a cultura popular, por que esta não recebe o devido tratamento nos anos em que a Copa não acontece? E na Copa, será que ela esta recebendo o devido tratamento? 

     Quando vemos uma matéria dessas podemos pensar assim: "que bom, aí está um benefício para a cultura popular, seus representantes diretos estão sendo contratados para trabalhar num grande evento", isso à primeira vista parece ser muito bom e seria se fosse verdade; na prática, estão convocando voluntários, isso mesmo, voluntários... que trabalharão de graça numa parceria do Governo Brasileiro com a FIFA. Na matéria da Folha, citada acima, temos esta informação e, como desculpa, a empresa responsável diz que 90% dos contratados para liderar esta abertura são brasileiros. Pergunto: como poderiam ser de outro país ja que as manifestações e apresentações vão ser sobre a cultura brasileira, contratariam um inglês para montar uma coreografia de Maracatu? Um mongól para o Samba? E um tcheco para o Frevo? 

     Cito como exemplo uma postagem no Facebook feita por Junior Perim, ator e coordenador executivo da empresa Crescer e Viver, que dentre outras ações organiza o Festival internacional de Circo no Rio de Janeiro que já esta em sua segunda edição:



"TELEFONEMA NA SEMANA PASSADA...


Fulana: "-Oi é o Júnior Perim do Circo Crescer e Viver?"



- Sim sou eu.



Fulana: "- Muito prazer. Meu nome é Fulana. Quem me deu seu contato foram, Beltrana e Cicrano. Eu estou trabalhando na direção do Casting do evento de abertura da Copa Mundo. Tudo bem?"



- Sim. tudo bem comigo. Mas diga lá...

Fulana: "- Na próxima quarta-feira estarei no Rio. Você poderia organizar os alunos que fazem malabares com bolas de futebol? Vou passar aí e seleciona-los para participarem da Cerimônia de abertura da Copa como voluntários."

- Peraí...mas os alunos que fazem formação aqui querem viver, trabalhar e se sustentar do seu trabalho artístico. Além disso o que você me pede também é um trabalho que o Circo Cresce Viver não vai fazer de graça para FIFA, com tudo que tem de investimento no mundial de futebol. Coisas de graça a gente faz aos montes, mas não precisamos da FIFA para nos produzir.

Fulana: "- Mas é que o nosso orçamento é muito baixo. E a FIFA ainda cortou uma parte significativa."

- Tudo bem, mas o que os alunos e o Circo Crescer e Viver tem com isso? Desculpa aí mas para FIFA a gente não trabalha de graça. Tenha um bom dia e boa sorte. Nós não estamos interessados.

NADA CONTRA TER COPA!!! O evento aqui no Brasil tem lá sua importância. AGORA NÃO DÁ PARA SE SUBMETER A ESTA FALTA DE QUALQUER COISA DA FIFA E SEUS PREPOSTOS."


     

     A abertura contará também com artistas nacionais e internacionais de renome (Claudia Leitte, Pitbull e Jennifer Lopez) que cantarão apenas a música tema da Copa e estes não o farão de graça. Entendem onde quero chegar? Mais uma vez vemos a diferença de tratamento. O que realmente representa e importa tem que ser voluntário e o supérfluo receberá altos cachês.

     E não pára por ai, o Minc (Ministério da Cultura) abriu um edital para apresentações e shows culturais nas sedes da Copa e este foi muito criticado por um simples motivo: os artistas só irão receber o cachê pelas apresentações depois do término do evento; lembrando que estamos em ano de eleição, então poderão receber apenas no próximo ano, terão que produzir seus espetáculos com o dinheiro do bolso e se derem sorte receberem 2 ou 3 meses depois. (vejam uma matéria sobre isso).

     Na matéria da Folha, Allan Cimermam, responsável pela empresa Team Spirit, que está organizando estes eventos e recebendo para isso diz : "Estes alunos (voluntários) não estão trabalhando a troco de nada, oferecemos, uniforme, alimentação, transporte e um certificado de participação". Cimermam que não gosta de usar o termo voluntário conclui: "Estamos trabalhando na capacitação de talentos para deixar um legado ao país". 

     Gostaria de saber qual é o investimento que estão fazendo, já que entram em contato com companhias artísticas renomadas, como o Circo Crescer e Viver do Junior Perim, e pedem os melhores artistas (alunos) disponíveis para um trabalho voluntário. Quem deixa legado artístico são estes artistas que trabalham de sol a sol aqui e não a empresa do senhor Allan Cimermam.  

     Minha crítica não é diretamente à Copa do Mundo, relembrando o que disso no começo, vamos descortinar as coisas que ficaram evidentes por causa da Copa mas que sempre aconteceram. Temos aqui uma das pontinhas do iceberg, podemos parar por aqui ou continuar a descobrir mais do que esta velado e lutarmos por um país melhor com Copa ou sem, um país onde o trabalho seja valorizado e devidamente remunerado ainda mais quando este esta na lista de obrigações do Estado. 

     Aguardo o segundo evento mais esperado do ano, as eleições, para ver o grau de insatisfação ou não da população. 

     A valorização da cultura é a valorização do que somos e temos, então, tudo se enquadra aqui dentro, a saúde, a economia, a segurança, a educação. Uma nação que não se valoriza não terá o por que investir em si mesma. 

     Lutemos para que isso mude até a próxima Copa no Brasil.
   

sexta-feira, 2 de maio de 2014

RACISMO, UMA REFLEXÃO ATÉ O PRÓXIMO CASO.

     Todos ouviram falar (superficialmente) do caso do Daniel Alves, jogador do Barcelona (Espanha) e também da Seleção Brasileira. Numa partida entre Barcelona e Villarreal, no último domingo (27/04/2014), após ser alvo de racismo com uma banana atirada em campo, ele (Daniel Alves) a pegou e comeu antes de cobrar o escanteio (Vídeo), isso gerou uma grande movimentação nas redes sociais com a hashtag #somostodosmacacos, um projeto bancado por Neymar com vídeos no Youtube e demais espaços publicitários, e também por Luciano Huck, gerando grande crítica para este ltimo que aproveitou o protesto e o manifesto para lucrar um pouquinho. 
     O tema do racismo me é muito claro e óbvio e já escrevi sobre ele em outro texto (Apontador Cotidiano), quero então me apegar a esta reflexão sobre os desdobramentos deste acontecido. 
     Todos os meios de comunicação mostraram o fato relatado acima e fizeram debates em seus programas. Você deve estar pensando: "Isso é bom, pois vamos refletir sobre". Por um detalhe muito claro eu não vi isso como a grande parte dos espectadores viu, tento e me esforço sempre para enxergar nas entrelinhas, mas neste caso nem foi preciso tanto. 
     Não somos todos macacos e estamos longe de ser, a referência ao macaco é uma alusão a alguém menos evoluído, e isso neste caso refere-se apenas a negros e não a todos que usam a hashtag, porque? Digo isso porque grande parte dos que usaram esta hashtag são contra bolsas ou cotas para negros mas não reclamam de ter seu curso ou pós-graduação pago pelo FIES ou pelo CAPES, percebem? No fundo esta hashtag que teve boa intenção, e com isso concordo, pois eu #souDanielAlves, serviu mais uma vez para maqui(n)ar o sistema e sua discriminação.
     De todos os programas que assisti, adivinhem quantos apresentadores e convidados que discutiam a questão do negro eram negros? Percebe agora? Quando o convidado não era um jogador de futebol ou cantor de pagode, a mesa debatedora se constituía apenas de brancos. Os parlamentares que discutiram o tema eram negros? E os professores universitários que levaram o tema para a sala de aula eram negros? Então, por favor, não me venham com esta hashtag em seu Twitter ou Facebook ou Instagram, venham com acesso à transporte, lazer, segurança, comida, água, moradia, cultura e educação, na verdade, entendo educação como a somatória de todas estas necessidades.
     Volto a dizer, como fiz no meu ultimo texto, que o problema não é quando alguém me acha inferior ou pior porque sou negro, ou afrodescendente, ou moreninho, ou pretinho, ou cor de burro quando foge, ou Cirilo, ou urubu, ou macaco e segue a lista de apelidos não racistas; o problema é quando este "achar" fere meus direitos legais, enquanto está apenas na cabeça de alguém, não tenho nada a ver com isso, isso passa a ser crime quando vira uma ação que tira um direito legal adquirido ou constitucional, como queiram, e aí aparece o grande problema, o Estado garante acesso em suas leis mas não cumpre na prática.
     Por isso afirmo que o preconceito é institucional, em vez de oferecer todo o direito oferecem algumas cotas. Entendam que eu não sou contra, sou a favor das cotas, ela diminui a porcentagem de negros fora da escola superior, os negros já somam 6% dos alunos universitários por causa das cotas. De cada cem vagas, apenas seis são alcançadas por negros. Claro que se formos para cursos tradicionais em universidades tradicionais o número de negros é zero, mesmo com cotas, vejam a USP como exemplo. Nem vamos pensar em quantos desses 6% conseguem emprego na área formada depois. Sou a favor das cotas como passo inicial para uma reformulação da sociedade, mas não devemos permitir que fique apenas nisso, não queremos esmola, queremos que as cotas sejam um primeiro passo para que os direitos sejam plenos. 
     A maqui(n)agem é clara, bem clara. Na verdade, esta hashtag mais maqui(n)a do que resolve a questão de identidade ou do preconceito. Lembro de um caso que me custou muito, vou relatá-lo aqui em tom de denúncia: 
          
          "Estava na quinta ou sexta séria, isso nos longínquos anos 90 do século passado, eu tinha 11 ou 12 anos, numa aula de educação física alguns coleguinhas de classe resolveram me presentear com um cacho de banana; eu era bolsista numa escola particular, era uma excessão à regra naquele momento, em toda a escola éramos em três negros,  pois ali não era lugar de um moreninho, e este delicado presente de meus coleguinhas deixava isso claro. Eu fiquei muito assustado, pois o cacho de bananas veio junto a alguns xingamentos bem amorosos, eu busquei a diretoria logo após a aula para solucionar o problema e repreender os meus coleguinhas de classe, lembro como se fosse hoje, eu usava um óculos vermelho, sempre gostei de óculos diferentes, subi a escada até a diretoria com o cacho de bananas na mão, contei a inspetora e ela levou o caso para a diretora que me chamou e fez algumas perguntas, e eu ali assustado disse que iria falar para meu irmão que era bem mais velho, grande e forte (todo irmão menor pensa isso de seu irmão mais velho?) e a diretora me disse que não seria preciso, que resolveria o caso e marcaria uma reunião com os alunos e os pais deles. Eu aguardo até hoje esta reunião ser marcada para ver meus coleguinhas de classe serem repreendidos, pois somos todos macacos não?" 

     De lá para cá o que mudou? Mudou que agora aprendi que eu deveria ter comido as bananas em protesto... 
     Até o próximo caso de racismo, boa semana.
   


segunda-feira, 28 de abril de 2014

É preciso maqui(n)ar bem para ficar bonito na foto

Velhos preconceitos presentes hoje, mas pouco comentados, pois maqui(n)ar é preciso. 

     Nestes últimos dias fatos corriqueiros, mais corriqueiros do que gostaria, chamaram a atenção mesmo sendo pouco divulgados, talvez pela camuflagem ou pior, pela naturalidade em encará-los.

    Um jovem preso por engano, piada, um comentário infeliz, pessoas imitando um macaco, pessoas chamando alguém de macaco demonstram a excelente maquinagem, quis dizer maquiagem, que permitem uma reflexão. 

     O ator e vendedor Vinícius Romão de Souza, de 26 anos, foi preso por engano simplesmente por ser negro, ter cabelo de negro, não houve uma averiguação para comprovar a acusação e ele foi preso em flagrante.

     A apresentadora Glória Maria da Rede Globo de Televisão foi vítima de uma piadinha no Instagram quando postaram uma foto sua ao lado de amigas de trabalho. 


     
  Créditos da imagem: entretenimento.r7.com

     Uma das moradoras da Casa do BBB deste ano, chamada Franciele, fez um comentário dizendo que se não passar desodorante fica com cheiro de neguinha.

     Três jogadores brasileiros,Daniel Alves (Barcelona), Tinga (Cruzeiro/MG) e Arouca (Santos/Sp), em jogos por seus clubes foram vítimas de racismo.

     O programa Encontro com Fátima Bernardes convidou o jovem preso por engano para participar e dar entrevista no programa e este assunto do racismo e do preconceito  teve um pequeno espaço no programa. 

     Existe um discurso que diz que todos são vítimas de um sistema que ensina desta maneira, não acredito que todos são vítimas, vitimas são Vinícius, Glórias, "neguinhas fedidas" e atletas negros por este país a fora. 
     
     Quero dar um recado especial pra você moreninho, marronzinho, você que não é tão negro assim, mas que também não é branco, talvez você, em algum momento, ouviu coisas do tipo: "mas você nem é negro", "você é no máximo moreninho", "é quase branco" (essa é minha preferida). Sua cor de pele vai mudar conforme a necessidade da ocasião. Como sei disso? Advinha… Será neguinho em algumas ocasiões convenientes e também será quase branco, quase aceito em outras. Assuma-se, encontre-se e não deixe que te enganem. Se quer saber como me considero, eu sou NEGRO, filho de negra, neto de negra e bisneto de escrava liberta, daqui em diante a genealogia continua em terras africanas.  


     Não devemos colocar panos quentes, devemos cutucar, vascolejar, isso nunca foi um caso isolado é uma questão política, então temos que exigir pautas políticas, temos que exigir penas mais severas, temos que exigir respeito através da luta, não lembro um período histórico em que isso tenha sido diferente.

     Creio que o problema deveria ser trabalhado nas escolas desde muito cedo, que as punições deveriam acontecer em todos os casos comprovados de racismo e preconceito, infelizmente a esta altura do campeonato não dá mais para esperar a compreensão e a aceitação de que não há diferenças entre cores, peles, narizes, que isso não demonstra de forma alguma capacidades inferiores ou superiores. O lindo sermão de Luther King não passa de um sonho, lindo sonho, a realidade é cruel, pelo menos por aqui, e negros necessitam tirar 12 nas mesmas provas para serem equiparados com brancos que tiram 8. Não há dúvidas de que isso acontece! 

     Qual negrinho ou negrinha não foi vítima de preconceito? Não conheço um que nunca passou por tal situação no mínimo constrangedora, numa blitz o negrinho não tem o mesmo tratamento do branco, em alguns lugares (restaurantes, lojas), na porta de entrada vem aquele olhar de reprovação dizendo que aquele local não é para você. Já viveu isso? (risos) Quantas e quantas vezes. 

     Poderíamos chover no molhado e dizer que todos são iguais, que todos merecem o mesmo respeito, que temos que ser daltônicos quanto à cor de pele, e poderíamos ser mais poéticos também, é uma linda teoria, na prática você não passa de mais um negrinho meliante, esse adjetivo vem de brinde, suspeito sempre. 

     E tem aqueles que invocam de seu interior coisas do tipo: racismo não existe, vejam o Joaquim Barbosa, vejam o Obama, claro que racismo não existe, é só olhar a sucessão de negros nestes cargos, é a coisa mais normal do mundo ver um negro ali, não é? E quando dizem que é mérito? Hahahaha eu me divirto, sim, sim, dizem que é mérito, então na história do Ocidente só dois negrinhos foram meritórios e o resto? O resto é vagabundo, não estudou, não trabalhou, porque se tivessem feito isso teriam chegado lá como o Joaquim e o Obama, exemplos da igualdade racial. 

      Sabe, queria estar ali no cantinho, quietinho, só olhando a reunião do dia 12 de maio de 1888, vendo e ouvindo a sublime decisão de libertarem os escravos. Ah que atitude bondosa, a mão de obra agora livre da migração européia estava chegando para substituir os negros, mas claro que teriam salários, seriam livres. Você achou que seriam como os negrinhos? E no dia 13, que cena linda, a Lei Áurea é assinada todos os negros são livres, que bonito. Pergunto: foram para onde? Trabalhar com o quê? Viver do que? Sabiam ler? Sabiam escrever? Qual foi o plano da Lei Áurea para isso? Não houve né. Os negrinhos ontem eram escravos e hoje são livres, sem ter para onde ir, sem direito a nada. Era só o que faltava, ainda quererem alguma coisa, já foram libertos. Eis aqui a criação da famosa favela, foram viver de vento, ar e luz em algum canto que acharam. E de lá pra cá o que mudou? Mudou que um Joaquim ousa sair de seu cantinho para alcançar algo maior, sem ter o mesmo acesso à escola, educação ou qualquer outra coisa que os demais livres têm. 

     O que às vezes confunde as pessoas e o que não quero saber é se alguém me acha ruim ou menor porque sou moreninho ou negro, não posso e não quero entrar na cabeça desta pessoa e mudar o que ele(a) pensa, isso claro enquanto for apenas um pensamento dele(a), não quero mudar a cabeça dele(a), quero que o que ele(a) pense não me atrapalhe socialmente, não me tire direitos, entendem a diferença? O problema não é ele achar algo a meu respeito, o problema é quando isso me atrapalha socialmente, é quando isso se torna institucional e um negro deixa de ter direitos básicos negados pelo que outra pessoa pensa, isso é o que deve ser combatido, a institucionalização do preconceito.     

    Racismo! Racistas! Preconceituosos! Aqui o preconceito é institucional, é uma marca registrada do Estado e da família brasileira. 


     O que fazer? 

    Que os atletas negros e os demais abandonem o campo a cada grito de Macaco. Que a Glória venha em Rede nacional e grite, não dá mais para ficar assim.

     Tivemos também o caso do jogador de vôlei Wallace.

     Estes foram alguns casos na mídia que não receberam maior atenção além de algumas matérias e o rostinho de triste dos repórteres. Eu quero mais! Quero que sejam todos tratados iguais, que os racistas paguem por seus crimes. 
     

     Não há mais espaço para a separação, não há mais espaço para a segregação, quer ela seja racial, social, sexual, somos todos iguais nos direitos e deveres e diferentes em nossas escolhas e isso deve ser respeitado. 

     Fica aqui de forma explícita minha repugnação contra estes fatos e tantos outros que acontecem a cada dia, não seja passivo nesta situação, ensine, eduque seus filhos ,sobrinhos, alunos, etc., para que eles tenham um mundo que nós não tivemos, onde o sermão de Luther King deixe de ser sonho e vire realidade. 

     I have a dream, I have a reality.

     Que o preconceito que gera a camuflagem deixe de existir. 

    


sábado, 19 de abril de 2014

Uma Ponte para Deus em Terabítia

Um dia desses passando pela sala, entre um afazer e outro, olhei para a TV transmitindo a fatídica Sessão da Tarde e lá estava mais um filme reprisado. Fui até a cozinha, mas fiquei de “orelha em pé” (quem tem um cachorro compreende o que isso quer dizer), porque era um filme de reinos encantados e distantes, não sei porque mas, desde muito pequeno, estes filmes me encantam (creio já ser tarde demais para abandonar um velho vício de infância). Durante o filme “Ponte para Terabítia”, me deparo com um diálogo que me espantou pela profundidade, já que era um filme para o público infanto-juvenil. Não que filmes para este público não tenham profundidade, mas discutir Deus e a religião de forma tão séria “do nada”, numa sessão da tarde (risos), sem avisar antes para nós adultos nos prepararmos para argumentar?
Refletindo depois (porque assisti ao filme mais três vezes), me lembrei muito de um livro de Rubem Alves “Perguntaram-me se acredito em Deus”. Se você não leu, precisa colocá-lo em sua lista de urgências vitais, antes de entrarmos no diálogo do filme. Lembro de uma estória que o professor sempre contava (sim, tive a sorte de ser aluno de Rubem Alves):
            “O galo era o mais imponente animal daquela fazenda, toda madrugada ele acordava, levantava e caminhava ao ponto mais alto do galinheiro, estufava o peito sob o olhar embasbacado de todos os outros animais, enchia o peito e cantava, cantava com toda estirpe de um tenor, e logo após o sol nascia no horizonte, ah que espetáculo, todos os animais ficavam impressionados com este canto e com este galo, afinal o sol nascia todo o dia apenas quando o galo cantava, que poder, e claro que todos tinham muito cuidado com o galo, afinal imagina se algo acontece com ele? Ficariam todos sem sol?
            Um belo dia o galo perdeu a hora e quando acordou, adivinhem? O sol já estava lá a pino, forte e imponente, e todos os animais zombavam descaradamente do galo, principalmente, o peru com aquela sua gargalhada peculiar. O galo ficou muito, muito tempo em depressão e o sol nascia a cada dia sem seu canto mágico, um belo dia, logo após o sol nascer, o galo levanta com toda pompa, sobe ao canto mais alto do galinheiro e começa a cantar, todos ficaram sem entender nada, por que cantar depois de tanto tempo, depois que o sol já havia nascido? Ele então responde: “antes cantava para o sol nascer e era um louco, hoje canto porque o sol nasce e sou um poeta!”
Vamos ao diálogo do filme “Ponte para Terabítia”, que se passa entre três crianças na carroceria de uma caminhonete ao saírem de um culto matinal. As três crianças são: Jess, May Belle (irmã de Jess) e Leslie (convidada para aquele culto dominical):
-       Leslie: Gostei muito te ter ido, toda história de Jesus é interessante não é?
-       May Belle: Não é interessante, é assustadora, enfiaram pregos nas mãos dele, somos todos pecadores e Deus fez Jesus morrer por isso.
-       Leslie: Acha que isso é verdade mesmo?
-       Jess: Está na Bíblia, Leslie.
-       Leslie: Vocês têm que acreditar e odeiam, eu não tenho que acreditar e acho maravilhoso.
-       May Belle: Temos que acreditar na Bíblia, Leslie.
-       Leslie: Por quê?
-       May Belle: Porque se não acreditar na Bíblia, Deus vai te mandar para o inferno quando você morrer.
-       Leslie: Nossa, May Belle! Onde ouviu isso?
-       May Belle: É verdade, não é Jess? Deus te manda para o inferno se você não acreditar na Bíblia.
-       Jess: Eu acho que sim.
-       Leslie: Eu não acredito. Sinceramente, acho que Deus não sai por aí condenando pessoas a viver no inferno. Ele está ocupado demais governando tudo isso (apontando para a Natureza).

Que diálogo interessante para uma sessão da tarde, me tirou o foco do trabalho naquele momento, parei e fui assistir ao filme.
Logo lembrei do livro de Rubem Alves, que responde a uma pergunta desafiadora. Conta ele que esta pergunta foi feita por uma senhora numa palestra sobre educação e ele a usou para escrever lindamente este livro confissão. Na obra, é nítida sua provocação a Bíblia e ensinamentos difundidos e aceitos pelo Cristianismo, ele brinca e desmonta muitas estórias, criando novas perspectivas, a começar pelo personagem principal do livro que é um senhor bem velho contador de estórias chamado Benjamim. Os conhecedores do Antigo Testamento já fizeram a ligação com um dos doze filhos de Jacó que deu origem ao povo hebreu, ele foi o caçula, sua mãe Raquel morreu no parto, agora ele já bem idoso faz as narrações.
Qual a ligação entre o trecho do filme (por que não o filme todo?) e o livro? Os dois tratam do mesmo assunto, a crença (fé), suas consequências, crises e esperanças.
A questão levantada no diálogo que mais me chama atenção é “vocês tem que acreditar e odeiam, eu não tenho que acreditar e acho que é maravilhoso.” Interessante afirmação, ali existe a religiosidade e uma perigosa liberdade daqueles que não são obrigados a crer. E tem alguém que é obrigado a crer? Sim, os religiosos, que vão a cultos matinais, vespertinos, mas têm dificuldades com o sono porque correm sempre o risco de irem para o inferno, são obrigados a crer na Bíblia com o único intuito de não irem para o inferno; é o peso de uma religiosidade.
A transgressora Leslie e o Mestre Benjamim de Rubem Alves têm muito a conversar, eles são livres e Deus não é um peso, um fardo, e sim um vento leve que sopra lindas melodias mesmo nas histórias mais tristes, eles não são obrigados a ouvir a canção, escutam porque gostam dela, percebem?
Mestre Benjamim conta sobre um Deus que parece uma fonte de água a jorrar, não para que ninguém não morra de sede e nem para que todos necessitem ir até lá beber, mas Ele é fonte e jorra, simplesmente, quem quiser pode ir beber. Um Deus mais poético, menos cartesiano, livre. A religião cria gaiolas. Não estou aqui defendendo este ou aquele Deus ou esta ou aquela percepção sobre Deus, estou aqui querendo abrir a minha gaiola, querendo ouvir e cantar doces melodias. Já se perguntaram porque nossas promessas para Deus são sempre sacrificiais? Vou deixar de comer, vou abrir mão disso ou daquilo, para quê?... Porque não podemos prometer escrever e(ou) recitar um poema para Ele? Não podemos sentar com Ele e ouvir o Prelúdio da Suite nº1 para Violoncelo (Cello) de Bach? Se você a toca, por favor, me chame para este momento “sacrificial”.
Vamos aprender com Benjamim ou com Leslie a não sermos obrigados a nada e, de livre espontânea vontade, ouvir e entoar canções, poemas ou um belo silêncio para Ele, o ETERNO.
Para terminar, não poderia esquecer o texto do Novo Testamento que fala sobre o filho pródigo. Todos sabemos da estória desta parábola, em que o filho mais novo pede ao pai sua parte na herança e sai a gastar e a viver de forma descompromissada, gasta tudo o que tem enquanto seu irmão mais velho continua ali ao lado do pai a trabalhar fiel; o mais novo teve que trabalhar cuidando de porcos para sobreviver e lembrou que os funcionários do pai dele possuíam uma vida mais digna e resolve voltar e pedir ao pai que o trate como um daqueles funcionários, o pai o recebe numa festa linda e claro que o aceita como filho, nisso o mais velho fica bravo pois sempre esteve ali trabalhando e nunca tivera uma festa. Creio que você já ouviu este texto em muitas mensagens ou palestras, mas o principal quase ninguém fala, no fundo o pai espantou o mais novo porque este esperava menos e o mais velho se chateou pois esperava mais, o que aprender nesta história? Simples, Deus não contabiliza débitos e nem créditos. Viva, pois Ele não espera nada de você, Ele é uma fonte a jorrar em todos os lugares, na sessão da tarde ou numa boa conversa com um velho contador de estórias.

E você, acredita em que Deus?





Bibliografia:


ALVES, Rubem. Perguntaram-me se acredito em Deus. São Paulo: Planeta do Brasil, 2007.
CSUPÓ, Gábor. (direção). Ponte para Terabítia (Bridge toTerabithia). EUA/Nova Zelândia: Walt Disney Pictures, 2007.